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  • Nosso tempo é marcado pelo adensamento das catástrofes presentes e passadas, assim como pelos desafios de narrar tais eventos traumáticos em busca de reparação e elaboração. O presente ensaio experimenta uma reflexão conceitual e sensível sobre nossos encontros com as vertigens das sucessivas desterritorializações urbanas e suas relações possíveis com os corpos que envelhecem nas cidades. O compromisso ético com a memória da catástrofe reside neste desafio paradoxal de trabalhar a favor da lembrança e do esquecimento, visto que, por um lado, os eventos estão ameaçados de soterramento e aniquilação e, por outro, exigem um esforço de elaboração e transmutação. A lembrança, nesta perspectiva, não está comprometida com a tentativa de reiterar o longínquo adormecido; trata-se antes de trazer à tona as multiplicidades inatuais para complexificar o presente em sua duração. O que está em jogo é a ferida que sobrevive, reivindicando não o resgate da paisagem, mas a produção de um desvio a partir das ruínas que já não podem mais ser ignoradas. Liberar o passado para a criação:  desafio daqueles que se debruçam sobre as cinzas para viver o luto e ultrapassá-lo, afirmando uma posição de travessia que acompanha as metamorfoses das cidades.

  • O presente artigo versa sobre a nossa relação com o tempo e com a memória, no que perdura de uma experiência nas manifestações sociais de Junho de 2013. O sentimento melancólico que insurge a partir da passagem deste acontecimento de grande intensidade política coloca-nos uma questão: o que estamos fazendo de nós? A questão se propõe a encarar os afetos que mobilizamos e nos mobilizam no âmbito da ação política e suas consequências: como rememorar a partir de uma postura ética com o presente? Utilizamo-nos da melancolia, do luto, do amor fati, do ressentimento, da força plástica, da duração, como diferentes operadores que arranjam uma ética da memória, a fim de pensar as ressonâncias entre 2013 e 2020. Buscamos construir um exercício memorialístico que abandone a posição ruminante em busca do que poderia ter sido diferente e vise a transformação, a produção de outros contornos a uma experiência.

  • Este trabalho demonstra como ocorreu o processo de disciplinarização do espaço-tempo na cidade de Porto Alegre no fim do século XIX e primeira metade do século XX, quando práticas segmentadoras buscaram prover simetria aos espaços e subjetividades para melhor adequá-los a uma sociedade onde o trabalho e a indústria imperavam. Visibilizamos aqui as diversas conexões sinérgicas entre reformas ordenadoras do espaço urbano e a criação de um espaço e de práticas específicos para o trato com a loucura. O surgimento da cidade e do seu hospício servem de fio condutor para uma cartografia das ciências normalizantes e sua luta por uma ortopedia do desviante. A necessidade de optimizar a utilidade da população e de permitir a convivência entre homens de civilidade urbana e moral burguesa erigiram uma série de dispositivos baseados em uma geometria centralizante, a qual é fundamental na construção da modernidade e sua principal criação: a normalização.

  • O artigo parte da situação da cidade de Porto Alegre e seu Hospital Psiquiátrico São Pedro na metade do século XX, constituídos a partir de uma geometria disciplinar centralizante,a qual buscava subjetivar corpos e gestos adequados para o trabalho industrial e aos padrões de convivência da civilidade urbana. Partindo desta configuração das forças, passamos a uma genealogia dos primeiros espasmos de dispersão que tomaram tais espaços, possibilitando sua transformação pelas práticas atuais: por um lado, no espaço urbano contemporâneo com suas segmentações privadas dispersivas; por outro, na atual reforma psiquiátrica, com a descentralização da assistência. Passando pelo momento de superlotação do Hospital e do Centro da cidade, para chegar às primeiras práticas de esvaziamento do centro urbano e da centralidade do espaço asilar, acompanhamos os movimentos que vão até o início dos anos 1980, criando as condições para a possibilidade da reforma no RS da década de 1990.

  • Entre os anos de 2018 e 2021, produzimos, no Núcleo de Ecologias e Políticas Cognitivas (NUCOGS) dois jogos: “Indústria do gênero” e “Ilha dos afetos”, buscando provocar breakdowns e contágios sensíveis que desloquem regimes de sensibilidade, dizibilidade, visibilidade de modo a complexificar-singularizar tramas de afetações e romper com políticas narrativas da outridade e do alterocídio. Os jogos operam como figurações para construírem espaços narrativos colaborativos heterotópicos por meio dos quais xs jogadorxs possam estabelecer dispositivos coletivos analíticos que coloquem em cena e problematizemos modos de vivermos juntxs. O artigo desenvolve uma reflexão acerca da potência micropolítica de narrativas e de figurações como dispositivos clínico-políticos e ético-estéticos para transformar o campo de possibilidades de afetar e ser afetado. Discute experiências de criação e realização desses dois jogos que tensionam, produzindo breakdown em nossos regimes normativos para as questões de gênero, raça, sexualidade, deficiências, classe, nacionalidade, entre outras. A proposta é produzir um artigo teórico-empírico que articule os conceitos de figuração e breakdown com a inserção de relatos da construção e uso dos jogos com adultos e crianças.

  • Este artigo apresenta conceitualmente ferramentas metodológicas erigidas e operadas em uma dissertação agenciando ficção e Psicologia Social na pesquisa da autoajuda como estratégia de governamentalidade. Delimita operações do método da narrativa ficcional para explorar um campo próprio da Psicologia Social: visibilizar e problematizar as tecnologias de subjetivação que dão corpo aos sujeitos contemporâneos. Para investigar as operações da autoajuda como constituintes das dobras de nosso tempo, necessitamos de uma escrita sensível e inteligível que nos permita visibilizar as tecnologias de si em ação na experiência cotidiana de governo e constituição do sujeito. Para tanto, foram criados um “personagem conceitual” e uma “figura estética” a fim de problematizar as Tecnologias de Si da autoajuda. Este ensaio pretende discutir modos experimentais de se pesquisar a partir da invenção de outros regimes de visibilidade, performatibilidade e dizibilidade, onde o texto se transforma em um espaço de respiro heterotópico de Escrita de Si.

Última atualização da base de dados: 21/11/2024 18:57 (UTC)

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